quarta-feira, 22 de março de 2017

Aracaju, quem serão teus guardiões?

Foto reproduzida do Google. Postada por MTéSERGIPE.

Publicado no blog Viva Sergipe, em 23 de maio de 2009.

Aracaju, quem serão teus guardiões?
Por Karine Santos Rezende*

Em um passeio pela nossa capital pude, com tristeza, assistir às várias mortes da nossa história. Nosso encontro fora marcado em uma Praça da Cidade de Aracaju. A praça na qual paramos não era uma pracinha qualquer... Lá os bancos vibraram ao nos ver, as árvores centenárias balançaram suas folhas, conduzidas pelo balé da chuva que viera nos saudar, pareciam saber que os falares baixinhos eram dirigidos a eles, ou melhor... Eles sabiam! Praça Olímpio Campos, antes Praça da Matriz, por ceder seu espaço a graciosa e divina igreja da Matriz. O que vemos ali? O silêncio de uma catedral! Bate o sino pequenino, sino de Belém... Mas os sinos... Ah os sinos, que não são tão pequenos assim... Cansaram de soar e emitir sua bela voz pendular! Eles não soam como dantes... O galo não canta mais, perdera seu terreiro. Agora quem manda é o medo! A prece roga apressada... E todos anseiam em chegar ilesos em casa. Corinto, engenheiro astuto; poeta e escritor, pensou que na Praça caberia um Parque: O nosso Teófilo Dantas. Neste Parque eram realizadas as festas natalinas. Muitos chegavam para a Chegança, o Reisado, e tentavam a sorte nos jogos de azar escondidos atrás da catedral! Sem falar na Rua do Egito que encobertava as suas Cleópatras sedutoras! Seguindo... Passeávamos pelo tabuleiro de Xadrez do engenheiro Sebastião Pirro. Dessa vez, todos fizeram xeque-mate, mas ninguém se sentiu vitorioso por isso, pelo contrário, a vergonha se espalhava no olhar daqueles que sentiam a morte do passado glorioso de Aracaju. A Praça Fausto Cardoso abre alas para os novos foliões passarem. Agora, já não havia marchinhas, nem confetes, nem namorados, nem a banda do 28º Batalhão dos caçadores...

Parque Teofilo Dantas.

Às vésperas do dia 28 de Fevereiro a cidade de Aracaju não dormia tomada pela insônia que inquietava os aracajuanos! Naquele tempo, onde chovia confetes na Praça Fausto Cardoso, as marchas docemente propagavam o clima do verdadeiro carnaval. O rei momo carregava no âmago da alma o sorriso e a simpatia singular de quem trazia consigo a satisfação por ter em mãos a chave da cidade! Ô quanto riso, quanta alegria! Não só as pessoas se vestiam, mas as praças, as ruas, vielas e becos não dispensavam ornamentações. Laços, fitas e máscaras eram penduradas para anunciar a festa que denuncia uma das faces do Brasil. À tardinha o comércio fechava suas portas para o trabalho e a fadiga. Abriam-se os corredores da Rua João Pessoa para a euforia e a alegria! A Praça da Folia sentia que iria logo ser adornada de gente! Salve Salve nosso maior carnavalesco, compositor e ilustre da boemia sergipana, Hilton Lopes, nosso grande ícone do Carnaval... Ai que saudade das suas indumentárias flóridas e de ouvi-lo dizer... ARIBÉ! Com tanta propriedade. Hoje, a folia fora jogada em um pano de guardar confetes e os novos foliões pisotearam as nossas melódicas marchinhas!Nosso carnaval não passa de... Prévias!

Fausto Cardoso recebera uma linda homenagem póstuma... Depois de um final trágico no local, onde hoje é a Praça, seu espírito olha com tristeza e dor, a solidão e o abandono.Caminhando em direção ao calçadão vemos aquela que nos remete à Paraíba, mas é que tão sergipana, quanto a Laranjeiras. Refiro-me à Rua João Pessoa. Não se assustem os que vêm de fora, em Aracaju tudo é assim. Somos peculiares em tudo, até mesmo em nome de ruas. Temos um bairro com nome de Continente: é o Nosso Bairro América, ponte que não é elo, “casa de divertimento” com nome de Vaticano, mitos e estórias que a nossa gente guarda e que nos torna singulares. Rua do Barão, depois Japaratuba... Finalmente João Pessoa, era ela a rua musa da capital! Abrigava as lojas, o Cine Palace e Rio Branco, a sorveteria Primavera, a relojoaria Gonçalves, a Livraria Regina, o ponto Chic, a Igreja São Salvador e muitos outros monumentos, que guardam, em suas paredes desgraçadas pelo tempo, a saudade de uma época que não regressa. A Rua João Pessoa tinha vida própria! As pessoas faziam-na de casa sem teto... Tal qual o poema de Vinícius de Moraes... “Uma casa muito engraçada, que não tinha teto, não tinha nada!” Porém, este logradouro entoava os ecos da experiência. Lá os velhos sentavam-se, trocavam estórias engraçadas e momentos de nostalgia... Hoje, só nos resta o vazio... O silêncio! O barulho não diz nada... Soa sem emoção... A minha geração é tão fútil quanto suas palavras... Ela está enferma e não se dá conta, pois sua doença é assintomática! Eu me pergunto: Aracaju que serão teus guardiões? Quem lutará com ímpeto para salvar a sua memória? Não sofra de amnésia, eu te imploro!

Seguimos com olhares atentos e atônitos... Por enquanto, pistas, pistas e mais pistas... Praça General Valadão, outrora, Praça do Quartel. Muitos nem sabem da nossa História que dirá dos nossos ilustres Sergipanos! O General Manuel Prisciliano e Oliveira, nascido em nossa primeira capital, São Cristóvão, foi combatente viril na Guerra do Paraguai, merecendo de forma justa, dar nome àquela praça. Era esta região conhecida como rua da Cadeia, por localizar, até 1926, a casa de detenção de Aracaju. Ali, muitas histórias ficaram presas e se perderam. Logo mais à frente sentia-se o cheiro característico das nossas feiras e mafuás. Outrora, a feira ficava dispersa lá na Rua Aurora... Que Aurora! A Aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais! Assim disse o poeta Casimiro de Abreu, inspiração que certamente deve ter aprendido com algum sergipano! O pôr-do-sol da rua da frente não encanta como dantes. Foi-se aquele instante em que assistíamos a passagem do bonde e ouvia o barulho de meninos brincando, fazendo travessuras, vivendo a infância pura dos tempos de rodas, piões e cantigas em Aracaju. Tic-tac! Diz o grande marcador do tempo... O relógio do mercado! Lindo! Belo!Impetuoso! Pontual! No mercado, encontramos não só mercadorias, mas pessoas valiosas: feirantes, carregadores, arte! Música! Cordel! O nosso João Firmino, Zé Antonio, os repentistas, caboclas, mestiças, gente que é a cara da Aracaju... Na passarela... Flores que perfumam o hálito dos quarteirões.O IBGE já divulgou: o país está envelhecendo. Sergipe está envelhecendo... Sim! Então, quem serão os herdeiros da nossa História?

Catedral Matropolitana de Aracaju.

O meu temor consiste em não saber quem serão os novos guardiões da História da minha Ara... Quem serão os novos Mários Cabrais, Murillos Mellins, Silvios Romero, Tobias Barreto, Joões Ribeiro, entre outros memorialistas. Reconhecer, infelizmente, é um verbo desconhecido dos filhos de Sergipe. Aracaju é “mãe dos outros e madrasta dos seus!” Precisamos criar consciência da nossa SERGIPANIDADE e valorizar as coisas da nossa gente. Sergipe é terra de povo ilustre, poetas, juristas, escritores, músicos, grandes mestres da educação e, enquanto, não tomarmos ciência disto, seremos culpados de enterrar a nossa própria história. Preocupa-me o fato de não saber que estórias teremos para contar. A quem iremos chorar nossos contos? A quem iremos “assustar” com as nossas lendas folclóricas? Aracaju para onde tu vais? E que passado levarás contigo? Muitos irão... Poucos deixarão rastros, mas tu Ara, espero que jamais sejas esquecida por aqueles que a veneram!

Cultura Sergipana (Taieiras).

Quanto a mim... Bem.... Só sei que nasci aqui nessa terra e vou morrer aqui mesmo nela!...

* Professora de historia, graduada pela UNIT.

Texto reproduzido do blog: vivasergipe.blogspot.com.br

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